terça-feira, 27 de abril de 2010

O Dia D.


No dia 26 de Dezembro de 2002 saímos de casa bem cedo para irmos a Coimbra levar a minha mãe para ser internada.

Desta vez íamos três e voltaríamos só dois.

Este foi de todos o momento que tentei por várias vezes imaginar mas nunca consegui por isso, parecia que estava a caminhar em terreno minado.

A manhã estava enevoada e chuvosa. Eu sentia o corpo dorido de tão tenso, mas tentei controlar-me o mais possível para não transmitir qualquer tipo de ansiedade à minha mãe.
Quando chegámos ao IPO, fomos com ela fazer as análises do pré-operatório e de seguida tomámos todos juntos o pequeno almoço.


Não consigo relatar com pormenores tudo o que se passou naquele dia, visto que apaguei algumas coisas da memória.
Recordo-me sim, muito bem, do que senti na altura e só peço a Deus para não voltar a passar pelo mesmo.

Embora sabendo que há milhares de pessoas que já passaram, e estão neste momento a passar por algo semelhante, cada um sente à sua maneira.
Não é que eu seja a filha mais perfeita do mundo, ou que a minha mãe seja um ser modelo, nem tão pouco que a minha família seja o protótipo de uma família perfeita, no entanto é assim que eu nos vejo.

E essa visão deve-se ao amor que nos une e à relação que foi construída desde o dia que os meus pais casaram e resolveram constituir uma família.
Eu sei que tenho uma Família! Sei que nem toda a gente tem essa sorte, outros haverá que nem sequer têm essa noção, do que é uma família, mas eu tenho, e é muito forte.
Percebe-se então o porquê de o meu cérebro não processar os actos ocorridos na altura mas sim o sentimento avassalador que me destruiu nesse dia.


O dia 26 de Dezembro foi o dia em que perdi o sorriso.

Foi o dia em que envelheci e ganhei duas rugas na testa, uma de dor e outra de preocupação.

Foi o dia em que morri e renasci, só que ao contrário da primeira vez, a dor de nascer (de novo) ficará para sempre registada na minha memória.

Sempre tive uma boa memória. A minha mãe diz que puxei à minha bisavó. Pelo que ela conta a cabeça da minha bisa parecia um computador registava e guardava tudo.
Infelizmente na velhice isso não lhe trouxe benefício nenhum visto que acabou por enlouquecer...

Na minha cabeça os acontecimento ficam registados como um filme. Quando quero recordar alguma coisa basta fechar os olhos e deixar fluir. É como no Cinema Paraíso, coloco a bobine, ligo o projector, et voilá!

Tenho que admitir que é bestial ter memória fotográfica. Só não quero ter o mesmo fim da bisa V.!

Neste caso concreto consigo visualizar-nos numa sala de espera, de repente a bobine salta, e vejo-nos já na enfermaria junto à cama em que a minha mãe ia ficar.
Como não havia muito a dizer e nada a fazer despedimo-nos dela e viemos embora.
Dei-lhe um beijinho com o coração muito muito apertado e com os olhos rasos de lágrimas.

Saí da enfermaria sem olhar para trás.

Chamei o elevador e enquanto esperava o meu pai juntou-se a mim. Assim que entrámos, não aguentei mais. Chorei e solucei como uma criança.
Senti-me abandonada e sozinha no mundo nesse momento. Mas pior que isso, era o sentimento de ter deixado ali a minha mãe, abandonada ao medo e à sua própria sorte no Hospital do cancro.

O meu pai abraçou-me também a chorar e pediu-me para ter calma. Foi horrível sentir a voz tremida do meu pai e as lágrimas dele a correrem na minha face.
Ainda agora consigo sentir aquela tristeza e aquela dor. Tal como naquele dia, também hoje não consigo conter as lágrimas.
Assim que cheguei à rua perdi o controlo e desatei num pranto. Doía-me o peito e quase não tinha ar para respirar.

Consegui atravessar a estrada, mas depois disso não consegui andar mais. Simplesmente caí e fiquei sentada entre o passeio e a estrada a chorar. Os carros e as pessoas continuavam a passar como se nada fosse.
O meu pai estava mais à frente, de costas para mim, encostado ao que julgo ser um sinal de trânsito a chorar. Ali ficámos assim durante algum tempo, até que ele veio, e me ajudou a levantar para irmos embora.
Entrámos no carro e ficámos em silêncio durante um bom bocado até que finalmente eu tomei a iniciativa e disse ao meu pai que já não estávamos ali a fazer nada e tínhamos que ir embora.No dia seguinte, devido à hora da cirurgia, não seriam permitidas visitas.

Só íamos poder voltar a ver a minha mãe dia 28 já sem a mama.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

E porque também é preciso amor...


Sabes que te amo e que faço tudo por ti.

És o motivo pelo qual me levanto de manhã e porque também escrevo durante horas intermináveis, à noite.
Sou estranha, eu sei. Mas é assim que sinto bem.

Sou feliz contigo e para mim é só que interessa.

Os últimos tempos não têm sido fáceis, mas acredito que se aguentámos até aqui, é porque a vida ainda tem muito para nos dar.

Basta acreditar. E eu acredito.

Preciso que não percas a fé e a esperança de virmos a construir um mundo melhor. Um mundo em que lutamos os dois lado a lado e nos congratulamos com mais um tijolo assente para o projecto que temos em mãos.

Neste momento está temporariamente em stand by, mas ambos sabemos que não é por falta de vontade ou porque algum de nós desistiu.

O sonho continua e está vivo dentro de nós.

Está apenas muito quietinho e escondido num sítio que só nós sabemos para que ninguém o possa encontrar e destruir.
Tudo irá melhorar. Prometo!

Esta minha terapia faz maravilhas e a vontade de viver está a voltar com mais força do que eu própria poderia imaginar. Tenho,sinto novamente vontade de voltar a ser EU!!!
Primeiro fiquei surpreendida mas depois de descobrir o porquê, faz sentido.
Tenho mais força e mais vontade de viver porque existes na minha vida e dentro de mim existe uma grande vontade de te fazer feliz por muitos e muitos anos.


És o meu ponto de apoio, a minha luz e a minha força.

Beijinho do teu Koala de Pé Frio.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Um estranho pedido de Natal.


A partir do momento em que dizem: "Pode ser chamada a qualquer momento!", acaba-se o sossego.

Por muito que se queira ou tente agir naturalmente, tudo vai por água abaixo com o simples tocar do telefone ou com a chegada do correio.
Os dias passavam lentos e as horas pareciam intermináveis.

Depois daquela última consulta nada mais havia a fazer. Tudo o que havia para ser feito ou dito já estava.
Restava agora uma espera indeterminada.

Durante esse tempo, apesar da espada que sentia sobre a cabeça, os dias decorriam dentro de uma normalidade à qual não estávamos habituados.


O meu pai andava bastante nervoso, passava bastante tempo fora de casa a trabalhar e quando estava em casa não falava sobre o assunto.


Eu adoptei o método de, durante o dia com a minha mãe andar sempre hiper activa e bem disposta. À noite, na privacidade do meu quarto libertava todas as minhas frustrações em intermináveis horas de choro. Normalnemte adormecia assim. Todos os dias rezava para que tudo corresse bem. Houve dias em que de facto acreditei que as minhas preces estavam a ser ouvidas mas havia outros que é impossível esquecer.

A minha mãe ora andava apática ou fazia de conta que estava normal. Claro que o que existia era uma enorme fragilidade que um simples sopro podia abalar a qualquer instante.
Os momentos de fraqueza da minha mãe perturbavam-nos a todos, não só porque a víamos em desespero mas também porque despertava os nossos próprios receios.

Houve um dia em particular, julgo que já em meados de Novembro, que me ficou guardado na memória, não pelo que foi dito, não pelo que se passou, mas sim pelo que senti.


Já tinha passado cerca de um mês e meio desde a última consulta e não havia qualquer notícia por parte do IPO. Durante esse tempo muitas coisas passam pela cabeça, boa e más, mas também muita gente opina da pior maneira possível.

Sempre que saíamos à rua e éramos abordadas por alguém que já sabia da "grande tragédia" era um desastre.
Toda a gente tinha uma história para contar de um familiar ou alguém conhecido que tinha tido cancro e faziam questão de relatar tudo ao mais ínfimo pormenor.
A maior parte destas histórias terminavam com a morte da pessoa em questão e sempre que isso acontecia eu via a cara da minha mãe fechar-se de preocupação e medo.


Nunca na vida tive que controlar tanto os meus instintos de fúria. Só me apetecia esbofetear todas aquelas pessoas e mandá-las morrer longe de mim.
Ainda hoje vejo a maior parte dessa gente como abutres.
De qualquer forma esses episódios tinham sempre consequêcias negativas na minha mãe e era muito complicado conseguir dar novamente a volta à questão.

Todos os dias eu fazia questão de ter tempo para o discurso positivo de mentalização e de perspectivar o futuro.

Esse dia, porém, não funcionou. Estávamos só as duas a almoçar e subitamente os pratos voaram da mesa e a minha mãe tem um ataque de pânico/fúria incontrolável.
Chorou, gritou, desesperou... Fez tudo a que tinha direito.

O tempo estava a passar e ela só queria que tirassem "aquilo" de dentro dela. Quanto mais o tempo passava pior. Como ela costumava dizer: "Na demora é que está o perigo".
Completamente transtornada, ligou para o IPO e falou com alguém tal como se estava a sentir e a pensar no momento.

Eu não aguentei estar a ver a cena e fui para o meu quarto e foi o que senti que me marcou.
Senti uma pena enorme da minha mãe e uma espécie de vergonha por ela ter perdido a compustura daquela maneira a ponto de ligar para o IPO a gritar.

Senti pena dela porque sabia que ela não queria morrer. Eu não queria que ela morresse. Senti-me envergonhada por ela estar a ligar naquele pranto para o Hospital. Senti resignação. E senti vergonha de mim mesma por me estar a sentir assim.

Ainda assim, continuei no quarto tempo suficiente para arranjar coragem de a encarar novamente.

Quando voltei para junto dela, disse-me que devido à conversa que teve com o IPO a tinham colocado numa lista de espera de desistências.
Fiquei sem perceber mas ela apressou-se a explicar.

Estávamos a aproximar-nos do Natal e apesar da época as cirurgias continuam. No entanto, há muitas pessoas que são chamadas e desistem porque recusam ser operadas naquela quadra festiva.
Eu considero isso uma estupidez porque afinal de contas, com que espírito é que uma pessoa está em casa com a família a saber que tem o "diabo" no corpo e que só por ser Natal e Ano Novo desistiu da operação que a pode salvar e sem perspectiva de uma nova data?
Enfim, cada um é que sabe.

Tenho que confessar que de início tive um baque mas depois não liguei e pedi a todos os santinhos para que ela fosse chamada. Foi esse o meu pedido para presente de Natal.


A partir desse dia as coisas serenaram um pouco e a rotina do dia a dia continuou.

Entretanto fiz 23 anos e para o Natal já só faltavam dez dias. Não havia quaisquer notícias.
O desespero voltava a instalar-se.

Até que numa manhã o telefone tocou e eu atendi.

Identificaram-se como sendo do IPO e perguntaram se estavam a falar com a minha mãe. Como a senhora do outro lado da linha parecia estar com alguma pressa disse que era eu. Do outro lado ouvi: "Houve uma desistência de cirurgia para dia 27 de Dezembro. Aceita?"

Imediatamente assumi a vontade da minha mãe e disse que sim. A senhora continuou: "Tem que se apresentar no IPO dia 26 de Dezembro às 11h da manhã para internamento."

Voltei a dizer que sim e terminou a chamada.

Sentei-me no sofá com uma sensação estúpida no peito. Era um misto de euforia e pavor.
Se por um lado estava contente por a terem chamado para ser operada, por outro seria o prosseguir do pesadelo. Ignorei os meus sentimentos e fui à procura da minha mãe pela casa.

Ela vinha a descer as escadas que dão acesso ao sótão e estava a sorrir. Engoli em seco e disse-lhe.
Reagiu exactamente como eu. É uma experiência única, verdadeiramente agridoce.

Já faltavam poucos dias para o Natal e para a operação. O que fazer?
Ceder ao medo e entrar novamente no turbilhão de pavor do desconhecido, ou adoptar a quadra Natalícia para fugir ao que se aproximava?

Nesse mesmo momento fui ao sótão e trouxe todas as tralhas decorativas e meti mãos à obra. Andei horas naquilo. A certa altura até a minha mãe se entusiasmou e começou a pendurar enfeites por todo a lado, nas portas da rua e de casa, nos candeeiros, nas paredes... Uma loucura. À noite, quando acendemos a iluminação e vimos o espectáculo montado rimos que nem duas perdidas. Estava demais.
Nunca mais voltámos a fazer uma coisa assim!

Depois disso os ânimos serenaram mas a preocupação começou a dominar a situação aos poucos e o dia de Natal foi como se não tivesse existido.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

A Sentença.


Por muito que tente nunca conseguirei explicar o que senti durante aquela viagem.

A tristeza era o sentimento dominante mas estava também muito revoltada com a vida e especialmente com o rumo que a situação estava a tomar.
A minha vinda para Lisboa, quando tinha 18 anos, marcou a minha entrada na vida adulta, o meu crescimento pessoal, sentimental e ajudou em grande parte a fazer de mim o que sou hoje.

No entanto Lisboa signicava acima de tudo a minha independência. Saí de casa dos meus pais directamente para a grande cidade e pela primeira vez na vida estava por minha conta e risco.
Tudo o que fizesse teria consequências e fossem elas boas ou más só eu era responsável.

De início reconheço que foi duro. A saudade dos pais e do conforto do lar onde cresci eram muitas mas foi a capacidade de gerir esses sentimentos que me fez crescer e amadurecer. A partir do momento que o fiz comecei a aproveitar e a tirar partido de tudo quanto esta cidade tinha e continua a ter para me oferecer.

Lisboa é uma cidade linda.


Por muito deprimida ou por muito mal que esteja, nada me faz tão feliz como deambular sem destino pela cidade, descer a Avenida da Liberdade e subir ao Chiado para tomar um café na Brasileira, olhar durante horas a fio para a Ponte, deslizar pelo rossio até ao Martim Moniz e desfrutar daquele ambiente repleto de diferentes culturas e cheiros.

Além disso, nada supera aqueles dias especias, que pela magia que têm, se tornam irrepetíveis por serem plenos de fascínio.

Os solarengos dias de Outono em que a cidade está envolta por um ténue nevoeiro adocicado do cheiro inconfundível das castanhas assadas.

As noites quentes de Verão e o aroma quente das sardinhas assadas vindo dos bairros castiços.

As tardes de Primavera onde se pode sentir o pulsar do coração de uma cidade que desperta para os dias de calor que se aproximam.

As manhãs de Inverno em que se sente o ar fresco e húmido do Tejo que se infiltra nas narinas e faz despertar o corpo para mais um dia de trabalho.

Os monumentos, que pela sua grandiosidade e beleza que me transportam para tempos e locais remotos e me proporcionam viagens fantásticas no espaço e no tempo interrompidos apenas pelo som inconfundível do deslizar do eléctrico pelos carris.

Como diz o poeta: "É esta Lisboa que eu amo!".


Todos estes sentimentos me acompanhavam na viagem de regresso a casa e por isso era imposível conter as lágrimas. No entanto, chorava também porque a minha mãe estava doente e precisava de todo o apoio e carinho que eu lhe pudesse dar e acima de tudo porque não a queria perder.
Chorava pela incerteza do futuro e chorava com medo do desconhecido.
Chorava acima de tudo com medo da morte que por esses dias ocupava a minha mente.

Não tenho qualquer memória da chegada a casa nem dos primeiros dias que lá passei. Recordo-me apenas do sentimento de alívio que tive inicialmente por estar junto da minha mãe e por sentir que o que estava a fazer era o correcto.

Sei apenas que os dias foram passando até irmos novamente a Coimbra à consulta que iria determinar o destino próximo da minha mãe e a partir daí sim, tudo quanto aconteceu está gravado na minha memória.
Assim que foi dito que o tumor era maligno, tanto os meus pais como eu nos mentalizámos que o mais provável seria a minha mãe avançar para tratamentos de Quimioterapia antes da operação.

A primeira coisa que ela disse foi que caso isso acontecesse, antes mesmo de começar os tratamentos iria rapar o cabelo para não passar pela humilhação de o ver cair.
Apesar de ter concordado com a decisão dela não queria pensar sobre isso.

A consulta foi, tanto quanto me consigo recordar, em finais de Outubro. Estava uma tarde chuvosa e um nevoeiro denso. O ambiente estava de cortar à faca.
Ao contrário das vezes anteriores não foi preciso dar entrada para as consultas e fomos encaminhadas para um outro piso.

Ao chegar lá, percebi que esse piso era o dos gabinetes de reuniões.

Os gabinetes não eram mais que salas com a mesma dimensão dos consultórios com a diferença que as mesas eram ligeiramente maiores e as paredes eram envidraçadas.
Sentámo-nos à espera, de frente para um gabinete onde estava a decorrer uma reunião e durante alguns minutos fiquei a observar o grupo de médicos que lá estava reunido.

Cá fora não se ouvia rigorosamente nada.

O que eu observava eram as expressões faciais de cada um deles. A conversa decorria serenamente entre eles, não havia qualquer sinal de agitação nem tão pouco de exaltação no entanto o cenário era para mim extremamente interessante até que finalmente percebi porquê.
Ninguém naquela sala estava a sorrir. Todos tinham a mesma expressão facial.
O mesmo semblante carregado de quem está a decidir o rumo de vidas humanas que se encontram no limiar da vida e da morte e eles, apenas mortais, estavam a tomar decisões de Deus.

Ao aperceber-me disso fiquei transtornada e tentei desviar o olhar mas não conseguia.
Resolvi então analisar cada um dos médicos e tentar descobrir qual deles é que iria falar connosco e dizer de sua sentença.

Acabei por desistir visto que estavam cerca de dez pessoas dentro da sala e podia ser qualquer um.

Cerca de trinta minutos depois, dou por mim já dentro de uma sala a falar com um médico, que juro não saber se estava naquele grupo ou não, e as notícias eram estranhas.
A minha mãe não tinha que fazer quimioterapia nem radioterapia mas ia ser feita a cirurgia para remoção de todo o tecido mamário esquerdo, tecnicamente uma Mastectomia.

Quando? Ninguem sabia dizer!
Ia ficar em lista de espera pois apesar de o tumor dela ser maligno era "apenas" Grau 1 e todos os casos mais urgentes tinham prioridade.

Posto isto, saímos em silêncio e a minha mãe começou a chorar. O meu pai assim que a viu desapareceu à nossa frente posivelmente também para poder chorar.
Curiosamente eu não deitei uma lágrima mas hoje percebo que ao longo do processo fui mudando a minha escala de medos.

Ou seja, a partir do momento que soube que a minha mãe tinha cancro todos os dias à noite, na privacidade do meu quarto, chorava até adormecer para não o fazer em frente à minha mãe.
No início chorava e pedia para que ela não morresse, não tivesse que tirar o peito, não lhe caisse o cabelo.
Com o passar do tempo queda de cabelo e ausência da mama foram saindo das minhas preces naturalmente.

A partir do dia que soube que a minha mãe ia ser operada, passei a pedir apenas que ela vivesse para poder aproveitar um pouco mais a vida dela, coisa que nunca fez até adoecer.